Na última Sexta-feira, faleceu o karateca Júlio Gusmão, ele será pranteado pela esposa, duas filhas e um filho, como um marido e pai exemplar, homenageado como dignÃssimo Promotor de Justiça e Professor Universitário.
Em Outubro do ano passado graças a especial gentileza do Isaias Brito, Yoda, obtive um contato com o Júlio, meu companheiro de treinamento, e falamos por mais de hora e meia ao telefone, tivémos lembranças magnÃficas e ficamos de nos ver neste inÃcio de ano quando ele viria à SP ... não deu tempo!
Nos dias que se seguiram ao nosso telefonema, estive para iniciar um tópico, este que inÃcio agora, para minimamente comentar sobre o Mestre Denilson Caribé, dois alunos da ASKABA - Associação Baiana de Karatê, o Júlio Gusmão e o Djalma Caribé, figuras importantes no Karatê nacional.
Nos anos 70 o Karatê tinha como centro o Rio de Janeiro e a Bahia e depois São Paulo, o grande lÃder era o Mestre Denilson, com quem os caciques Tanaka, Sagara, e todos outros, iam buscar orientações e pedir a "benção", e dinheiro ... eu presenciei algumas vezes e tive notÃcia em outras das suas doações para professores em dificuldades, Federações e para a própria Confederação Brasileira de Pugilismo, na época, era um dirigente "à s avessas" do que vemos hoje, ele punha ao invés de tirar. Sem muita exposição ele ditava as regras e os professores japoneses seguiam, por saber da sua seriedade e comprometimento com o Karatê.
A ASKABA era uma organização poderosa, na academia em Salvador tinha mais de 1.500 alunos/mês matriculados, além de sub-sedes em todo o Estado, mais professores filiados em outros Estados do Norte Nordeste, ele comandava de maneira inflexÃvel o Karatê naquela região.
Em 1975, enviados pelo Denilson, chegaram à SP dois jovens karatecas, o Júlio e o Djalma (tinham 18 anos), para treinar na academia do Okuda, eles haviam sido escolhidos e tinham a responsabilidade de aprender o melhor Karatê disponÃvel no Brasil, e levar para a Bahia, essa era a missão deles, moravam na academia, comiam na casa do Sensei e treinavam muito.
Nos primeiros 6 meses treinavam 5 horas por dia, somente tarde e noite, como não era permitido à ninguém assistir nosso treinamento pela manhã, e como eles moravam dentro do Dojo, ou eles saiam para o colégio antes do inÃcio do treino ou então ficavam trancados no quartinho num silêncio total, tempos depois contaram que urinavam em garrafa, porque nem ao banheiro podiam ir, e que ficavam olhando o treino pela fresta da porta. Depois pararam de estudar e passaram a treinar pela manhã como "convidados" (significava ser a bola da vez, toma-lhe porrada) no treino profissional, mas era o que queriam ... estavam sempre prontos para treinos, demonstrações, competições ... era um ritmo forte de Segunda à Sábado.
Eles tinham coisas de garotos, certa vez fizeram uma aposta, valendo o que não sei, de não mais andar normalmente na rua, entre a academia e a casa do Sensei, ou seja, só se deslocariam em "sapinho", percorrendo 4 vezes por dia uma distancia de pelo menos 250 metros, se o mercado estivesse aberto, caso contrário pegavam duas ruas de grande movimento (Vergueiro e Gentil de Moura) o que chamava muita atenção e era motivo de chacota que não lhes afetava em nada. O Júlio, nem sei por quanto tempo por meses quem sabe, andava com o dogui todo manchado de sangue nos fundilhos, porque todos os dias depois do treino ele fazia 500 flexões abdominais, e no inverno como os doguis não secavam, ele treinava com o dogui sujo e molhado, era coisa de louco. Não esqueço da felicidade estampada na cara deles quando eram convidados para alguma festa ou mesmo para jantar na casa de um de nós ... estavam longe de casa numa pressão brava, os dois eram karatecas mesmo!
Há pouco quando falei com o Júlio, ele lembrou que para ir à uma festa e como não tinha roupa limpa, eu dei a ele uma camisa de seda azul e ele me contou que até alguns anos atrás ainda a tinha como recordação.
Para concluir, o Júlio sempre foi devotado ao Karatê, mas somente agora eu tomei ciência do tamanho desta devoção, o nome do seu unico filho homem é SHIRAI, em homenagem ao Sempai do Okuda Sensei.
Bem, penso assim, o Denilson um exemplo inatingÃvel e os dois meninos que aqui chegaram, sairam Karatecas!
Meu respeito, minha admiração e minha amizade à eles.
Oss